Sancionado no dia 15 de julho de 2020, o novo marco legal do saneamento (lei 14.026/20) ampliou as expectativas de avanço no setor, mas ainda traz questionamento sobre vários pontos da legislação.
Entre os resultados da aprovação do novo marco, os recentes leilões para concessão dos serviços de saneamento mostraram o grande interesse do mercado pelo setor. Entre eles, em Maceió (AL), a proposta vencedora apresentou outorga de aproximadamente R$ 2 bilhões ante o valor mínimo da disputa de R$ 15,1 milhões.
Na PPP de Cariacica (ES), os investimentos devem alcançar R$ 580 milhões em infraestrutura de saneamento básico ao longo dos 30 anos de contrato. A vencedora tem o compromisso de investir R$ 180 milhões nos primeiros cinco anos do projeto. O certame do Rio de Janeiro também superou as expectativas.
Um novo levantamento da ABCON SINDCON, associação das operadoras privadas de saneamento, mostra que a maioria dos estados já está debruçada sobre o tema e avançando. Na primeira análise do Painel são identificados 11 estados que já aprovaram ou possuem projetos de lei em trâmite para estabelecer os blocos de municípios em seus respectivos territórios.
Para o diretor executivo da ABCON SINDCON, Percy Soares Neto, a regionalização avança a passos largos pelo país: “Os estados entenderam a lógica do novo momento do saneamento e estão organizando suas regiões. Cada região terá sua governança e sua dinâmica na prestação dos serviços, demandando uma sólida e comprometida articulação interfederativa, exigindo coordenação estável entre os entes. O momento é de somar esforços para levar saneamento a todos. O saneamento precisará de uma solidariedade federativa”.
Para o diretor, apesar do desafio da regionalização começar a ser vencido, é fundamental proporcionar segurança jurídica, estabilidade institucional para garantir qualidade na prestação dos serviços à população e confiança dos investidores: “Esse é um desafio de todos os entes federativos, bem como dos poderes executivo, legislativo e judiciário. Não podemos nos perder do foco da universalização do saneamento”.
Questionamento
Por outro lado, a Aesbe (Associação Brasileira de Empresas Estaduais de Saneamento) protocolou uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI6882) contra um dispositivo da Lei nº 14.026/2020. O processo, encaminhado para o Supremo Tribunal Federal, diz respeito ao artigo 16, que veda a celebração de contratos de programa para os serviços de saneamento básico.
Segundo a entidade, no projeto de lei original, aprovado pelo Congresso Nacional, as cidades podiam firmar acordos diretamente com as estatais de água e esgoto, por meio de contrato de programa, sem concorrência. Com a impossibilidade de acordo entre as partes, isso não poderá mais ocorrer.
Na ação, a entidade entendeu que a legislação fere a Constituição Federal, em especial o art. 241, que estabelece que a prestação de serviços públicos, inclusive os de saneamento básico, pode ser realizada diretamente pelo poder público (de maneira centralizada ou descentralizada), indireta, por concessão (licitação) ou por consórcio público.
André Luis Pereira Oliveira, coordenador da Câmara Técnica Jurídica (CTJ) da Aesbe, mostra os pontos positivos e negativo da nova lei: “Reconhecemos que o Novo Marco Legal do Saneamento trouxe avanços e promoveu alterações que são bastante salutares para o desenvolvimento do saneamento no país. Porém, a ADI proposta pela Aesbe tem como foco alguns pontos específicos da Lei n.º 14.026/2020, cuja inconstitucionalidade já vem sendo destacada por nós desde o início da tramitação do PL no Congresso Nacional. O ponto mais sensível e elemento nuclear de nossa investida junto ao STF é a tentativa de se limitar, por meio de uma norma infraconstitucional, uma prerrogativa que é expressamente prevista em nossa Carta Magna, qual seja: a constituição da gestão associada”, afirma.